domingo, 17 de janeiro de 2016

QUAIS FATORES DEVEM SER CONSIDERADOS NA ESCOLHA DA ESCOLA DE AVIAÇÃO OU AEROCLUBE

SERÁ QUE O QUE IMPORTA É SÓ O PREÇO???

Olá pessoal, após um bom tempo sem novas postagens, hoje irei falar sobre um tema muito solicitado pelos leitores do blog, no entanto quero lembra-los que essa é a minha opinião, com base na minha experiência, e vou tentar ser o mais imparcial possível. Há muito tempo que eu quero falar sobre “Quais os fatores vocês devem considerar na hora de escolher uma Escola de Aviação ou Aeroclube para receber a instrução prática de voo?

O que mais observei entre meus alunos e leitores do blog é que, devido ao alto custo das horas de voo e a grande diferença de valores em várias regiões do país, o principal fator considerado é o preço. No entanto, além do preço, existem diversos fatores que devem ser levados em consideração, como: Localização, infraestrutura, quantidade e variedade de aeronaves, quantidade de instrutores, formas de pagamento, condições climáticas predominantes, manutenção, histórico de acidentes, reconhecimento do mercado de trabalho, entre outros. Irei falar um pouco de cada um deles, da forma que eu consideraria hoje se fosse escolher uma escola ou aeroclube.



- Localização: Esse aspecto é extremamente importante! Deve-se levar em consideração o tipo de instrução que o futuro aviador pretende receber. Ou seja, qual será o seu foco inicial (é, porquê é muito comum mudarmos o nicho de mercado que queremos trabalhar no decorrer da nossa formação) . Se vai ser na aviação comercial, executiva, agrícola, aeronaves anfíbias, experimental, instrução, etc. Se pretende seguir carreira na aviação comercial, pesquise sobre as escolas que possuem elevado índice de aprovação nas seleções das companhias aéreas, um bom histórico de ex-alunos contratados e, infelizmente para boa parte dos leitores, posso adiantar  que essas escolas estão concentradas nos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte. Até porque as companhias aéreas também estão lá. Isso não significa que os candidatos de outras regiões não serão convocados para as seleções ou não serão contratados. Ainda assim deve-se considerar o seguinte: Se resolver estudar em São Paulo, no Campo de Marte, saiba que o tempo de solo (do acionamento até a decolagem) será bem maior que o tempo gasto em Rio Claro, por exemplo. Isso também vale para o deslocamento do aeroporto (aeródromo) até a área de treinamento. Em compensação nos aeroportos mais movimentados como Campo de Marte e Jundiaí, o aluno terá uma outra vivencia com as regras de tráfego aéreo aplicados na prática, assim como fraseologia aeronáutica, rotina aeroportuária, convivência com diversos profissionais da aviação executiva, etc. Ainda com relação a localização, se você está pretendendo estudar fora da sua cidade, lembre-se que precisa de um aeroporto com fácil acesso, próximo a supermercados, pontos de ônibus, farmácia, etc, já que você provavelmente terá que ficar em alojamentos e irá precisar se deslocar frequentemente a esses estabelecimentos e isso deve ser incluso no “custo final”.

- Infraestrutura: muito importante!!! A escola que está pretendendo voar possui uma infraestrutura adequada às suas necessidades? Vai precisar de alojamento? Nesse alojamento possui quartos para homens e mulheres, como é a mobília, possuí acesso à internet, chuveiro elétrico, como é feita a limpeza? A escola/aeroclube Possui sala de briefing/debriefing, secretaria, biblioteca, sala de estudos, sala de palestras, lanchonete, estacionamento? Isso tudo deve ser considerado de acordo com as necessidades e prioridades de cada um. Morei um ano no alojamento do Aeroclube de Campinas e essa foi uma experiência muito válida pois convivia diariamente com instrutores, mecânicos, alunos na mesma fase de instrução que eu, outros bem mais avançados. Hoje em dia o alojamento do Aeroclube de Campinas foi separado do alojamento dos instrutores e funcionários, ficando exclusivo para os alunos. Há quem goste, eu particularmente prefiro tudo junto e misturado, mas vai de cada um.

- Quantidade e variedade de aeronaves: Também é preciso ter uma ideia de qual o nicho de mercado que mais se identifica. Por exemplo, se quer seguir carreira na aviação agrícola, escolha escolas/aeroclubes que possuam aeronaves com trem de pouso convencional (Paulistinha, Aeroboero, PA18, J3, Citabria, C140, etc). Existem escolas que direcionam o seu treinamento de acordo com o seu objetivo, é só se informar junto à coordenação de instrução. Outro fator importante é que se vai estudar em uma escola/aeroclube com 2 aviões, sua experiência será diferente do treinamento recebido em uma escola/aeroclube que possua 20 aviões. Isso se deve ao fato que se a escola/aeroclube estiver com muitos alunos a escala de voo certamente ficará cheia, prejudicando a frequência dos voos devido a menor disponibilidade de equipamentos, da mesma forma quando uma das aeronaves entrar em manutenção preventiva ou corretiva também enfrentará problemas se a escola/aeroclube tiver muitos alunos. Também não adianta muito ter estudado em uma escola/aeroclube que possua 10 aviões, todos C152. Aí entra em campo a variedade de modelos. Eu concluí minha formação de PP/PC/MLTE/IFR/INVA voando GURI, PAUL, AB11, C150, C152, C172, P28R e PA30. Isso enriquece seu currículo e aumenta a sua proficiência e adaptabilidade. Falam muito mal do Aeroboero, mas como diria um amigo meu que hoje voa na Azul: “existem dois tipos de pilotos: Os que gostam de Boero e os que não sabem voar Boero”. Garanto que um piloto que só voou C152, vai “sofrer” um pouco quando for voar uma aeronave convencional. Mas um piloto que só voou Boero, não vai encontrar nenhuma dificuldade de voar qualquer avião triciclo.

* Bônus: Acho que todos deveriam voar aeronaves com trem de pouso convencional em algum momento do treinamento. É um avião fácil de voar e difícil de voar bem. Para entender melhor esse frase e esse assunto, recomendo ler um texto em inglês do Air Facts Journal clicando AQUI.

- Quantidade de instrutores: esse será diretamente proporcional a quantidade de aeronaves. Nesse momento, caso seja possível, avalie a experiência do corpo de instrução como um todo (em horas de voo). Todos sabemos que no Brasil é comum pilotos utilizarem a atividade de instrutor de voo como um “degrau” para as companhias aéreas e isso dificilmente irá mudar a curto e médio prazo. Mas tire uma média. Se na escola existirem 10 instrutores, pelo menos metade deve ter entre 500hrs e 1000rs. Isso será muito importante porque entre os instrutores há muita troca de informações cruciais para um bom desenvolvimento da instrução. Existem alunos que preferem voar com apenas um ou dois instrutores, outros preferem variar ao máximo. Existem escolas/aeroclubes que permitem que o aluno escolha com quem quer voar, outras tentam dar preferência, outras proíbem a escolha. Eu preferi voar com diversos instrutores, mas pude escolher com quem NÃO queria voar. Era questão de empatia, afinidade e como eu ainda tinha o “poder da escolha” eu fiz uso dele.

- Condições climáticas predominantes: Esse é bem legal porque tem gente que acha que voar em Natal é sensacional porque a cidade é conhecida como a “noiva do sol”, 300 dias de sol por ano, vou poder voar pra kara***. Óbvio que aqui chove pouco, mas os ventos são intensos e devido a umidade e temperaturas elevadas, é normal a formação de nuvens cúmulos (não estou falando de cumulonimbus), o que torna a atmosfera mais instável e turbulenta. Já se vai voar no sul, seus voos serão constantemente cancelados devido a chegada de frentes frias à superfície, com chuvas, ventos fortes, granizo, etc. Então considere esse fator na hora de escolher sua escola/aeroclube e saiba que independente da região do país, seus voos serão cancelados diversas vezes por condições meteorológicas, o resto da sua vida, na instrução ou como profissional.

- Manutenção: Vocês conhecem aquele ditado “quando a esmola é demais o santo desconfia”? Pois é!!! Se você está decidido a voar em uma escola/aeroclube que está vendendo a hora de C152 por R$199,00 tenha certeza que o próximo acidente dessa entidade poderá ser com você. Hoje, com o atual preço do dólar e do AVGAS não é possível que uma escola consiga ter lucro vendendo a hora de voo a esse preço. A melhor coisa a fazer é realizar uma pesquisa de mercado, com as principais instituições da região. Não vale comparar o preço da hora de voo de uma escola/aeroclube da Paraíba com outra de Santa Catarina. Os custos operacionais são diferentes em cada região. Se está pretendendo estudar no sul, pesquise entre as escolas do sul e se entre elas houver uma disparidade muito grande no valor, certamente alguma coisa está errada e vale a pena aprofundar a pesquisa se essa diferença não está refletida na manutenção deficiente. A mesma coisa vale para todas as regiões do país. No entanto, após escolher, quando já estiver no treinamento, apesar de ser essencial manter os olhos bem abertos e ficar atento a qualquer anormalidade, lembre-se que tratam-se de aeronaves de instrução e é normal que as coisas não estejam do jeito que a gente vê nos ensaios de voo da Aeromagazine. Os alunos e instrutores quebram as partes plásticas do painel, os dizus, os pontos de dreno, , fecham as portas dos Cessninhas como se estivessem fechando a porta de um Maverick, apertam a rosca da vareta medidora de óleo como se estivessem fechando uma garrafa de coca-cola de 3litros para não perder o gás nunca mais, checam os comandos como se pretendessem executar uma manobra evasiva ainda em solo, além dos catrapos nossos de cada dia que ninguém escapa. Imagine 8 pousos por hora, 6 horas por dia, 7 dias por semana, durante 1 ano... esses aviões são resistentes pra kara***. Mas... uma hora quebra e pra prevenir que esse “quebrar” seja em voo, a manutenção preventiva (revisões de 50h, 100h, etc) devem ser feitas cumprindo o previsto pelo fabricante em oficinas homologadas. Se não estiver sendo feito assim, procure saber o que está acontecendo.

** Bônus 2: Tive um excelente aluno que fez o PP no Aeroclube de Cachoeira do Sul e depois foi voar em Campinas que levou consigo o hábito de limpar o plex com cera automotiva. Outros alunos cuidam como se os aviões fossem deles, em compensação tem instrutor que pelo jeito que ele cuida do avião, eu imagino como deve ser a casa dele... mas é isso, é a vida. Só tomem cuidado por que na aviação é a SUA vida que está em jogo.

- Histórico de acidentes: esse aí é fácil de falar. Realize uma pesquisa breve no site do CENIPA e veja quantos acidentes/incidentes aconteceram na escola onde você está pretendo voar. Também pesquise em fóruns, redes sociais... Claro que existem muitos incidentes e acidentes que não são relatados ao CENIPA e a ANAC, descumprindo a legislação em vigor. Para esses casos, você só vai descobrir no bate-papo com quem já esteve por lá. Aproveitando, veja se a escola/aeroclube possui um Sistema de Gerenciamento da Segurança Operacional - SGSO eficaz, se o MGSO está atualizado, se for conhecer pessoalmente a escola/aeroclube, procure pelos boletins, informativos, recomendações nos murais de segurança operacional, veja se os instrutores e alunos são estimulados a preencherem RELPREV, Fichas do Cenipa (CENIPA 15, por exemplo), etc. A sua segurança depende muito da política que a escola adota nas suas operações diárias e isso será facilmente percebido quando você já estiver lá voando. Se não se sentir seguro, procure o GSO responsável ou a coordenação de instrução e comente sobre o assunto.

- Reconhecimento do Mercado de Trabalho: esse funciona assim: Quando eu resolvi pesquisar sobre o curso de piloto agrícola (era o meu objetivo inicial) todos me indicavam o Aeroclube de Ponta Grossa ou a Aviação Agrícola Santos Dumont em Cachoeira do Sul. Isso é notório entre os pilotos agrícolas. Mesmo que outras escolas importantes ofereçam também o mesmo curso, o mercado me mostrava que seria importante para uma melhor colocação profissional se eu fosse voar em uma dessas duas escolas. Lembrando que não fiz o curso de piloto agrícola, não conheço pessoalmente nenhuma das duas escolas e muito menos as outras. Esse foi apenas o que me ocorreu na época quando eu fazia as minhas pesquisas. Da mesma forma isso acontece com a aviação comercial, executiva, etc.

*** Bônus 3: Recentemente, eu e alguns colegas fizemos uma pesquisa ligando para diversos aeroclubes e escolas do Brasil inteiro sobre quais as cartas de navegação que as escolas/aeroclubes adotavam para o treinamento de voo por instrumentos (IFR), se eram Jeppesen ou DECEA. Descobrimos que no Rio Grande do Sul praticamente todos eles usavam Jeppesen, inclusive a PUC-RS. Já em São Paulo apenas um Aeroclube usava no treinamento simulado e real, e uma escola utilizava Jeppesen no treinamento simulado. No restante do país a maioria não sabia nem do que estávamos falando. Isso é de fundamental importância na hora de escolher onde fazer o treinamento IFR, se você pretende seguir carreira na aviação comercial, já que todas as empresas brasileiras utilizam nos seus processos seletivos e durante os voos diários cartas Jeppesen. Não é nenhum bicho de 7 cabeças, mas a disposição das informações, layout gráfico, entre outras coisas nas duas cartas são feitas de formas diferentes, mas ambos são eficientes no que se propõem a fazer. Me espanto em saber que as escolas/aeroclubes não dão a devida importância a este fato e parabenizo a PUC-RS escolas e aeroclubes do Rio Grande do Sul por serem pioneiros e exemplo na utilização das cartas Jeppesen durante o treinamento.

- Preço da hora de voo e formas de pagamento: Bom, aí é que o bicho pega. Os valores variam muito de acordo com a região do país e esse fator no meu ponto de vista só deve ser considerado após todos os outros terem sido avaliados. É porque se você mora em Macapá, e lá a hora de voo está R$ 500,00 e você está pretendendo voar em Porto Alegre porque lá a hora está R$ 400,00 considere as despesas com deslocamento, alimentação, hospedagem (aluguel de um kitnet ou permanência em alojamento), fatores climáticos, distância da família, capacidade de adaptação a uma nova “cultura”, diferenças sociais, etc. Os mesmos cálculos deverão ser levados em consideração se você é de Indaiatuba-SP, por exemplo, e está em dúvida entre Campinas, Sorocaba, Jundiaí, Bragança, Piracicaba, São Paulo, etc. Certa vez um aluno resolveu mudar de Aeroclube por causa de R$10,00. Mas ele morava na cidade que o preço estava R$10,00 mais caro. Ou seja, ele teria que viajar cerca de 1h de carro, pagar 2 pedágios, correndo o risco de chegar lá e ainda não voar por diversos fatores. Vale a pena? Ah, verifique todos os detalhes do contrato de compra de pacotes de horas de voo, muitas escolas que vendem pacotes promocionais estipulam prazos para que seus alunos voem essas horas compradas em pacotes. Também é comum que o aluno pague a diferença do valor pago pela escola pelo combustível. Se a sua escola/aeroclube paga R$5,00/l de AVGAS na base de operações e você fizer uma navegação para outro aeródromo, fizer o reabastecimento e o valor for R$5,50/l e você vai arcar com os R$0,50 de diferença em cada litro abastecido. Se for mais barato, não será ressarcido, é claro!!! rsrsrsrsrs
A forma de pagamento varia muito de uma escola/aeroclube pra outra. O que eu sugiro sempre é que não seja um aluno chato, implicante, que reclama de tudo, que já chega gritando, que tira um “bolo de dinheiro” do bolso e acha que pode falar o que quiser. Tudo se resolve com uma boa conversa, seja sincero, honesto, faça sua proposta e se não for bom para as duas partes, considere mudar de escola/aeroclube. É melhor do que ficar enchendo o saco de todo mundo por que você não conseguiu R$5,00 a menos no valor da hora de voo. Lembre-se que na aviação todos se conhecem e manter um bom relacionamento é fundamental. Alunos problemáticos, arrogantes, prepotentes, certamente enfrentarão dificuldades na instrução, na colocação no mercado de trabalho, é a seleção natural. Uma hora a casa cai, é a Lei da selva!!!

Bom pessoal, espero ter ajudado, tentei ser o mais imparcial possível, considerando as pesquisas que eu fiz, o que eu acho importante e prioritário para a minha formação e para a minha carreira.
Compartilhem, comentem, divulguem e se tiverem alguma crítica ou sugestão de outros assuntos me enviem que esse ano o Papo de Hangar vai com tudo!!!!


Abraço a todos e bons voos sempre!

Bruno Maciel

Um comentário:

Unknown disse...

Parabéns, excelente post. Estou juntando vários posts como o seu e fazendo um guia de perguntas.